terça-feira, 3 de abril de 2012

Molon critica tentativa de ruralistas de precarizar direitos sociais e ambientais

Em artigo publicado no jornal O Globo (2/4), intitulado “Ataque à Constituição”, o deputado federal Alessandro Molon (PT-RJ) critica a tentativa da chamada bancada ruralista de precarizar conquistas da Carta de 1988. Ele cita especificamente a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215/2000, que retira da União e passa ao Legislativo a competência para a criação de reservas indígenas, de quilombolas ou zonas de conservação. Para Molon, trata-se de um retrocesso e de uma flagrante violação da Constituição. Leia o artigo na íntegra:


" A bancada ruralista da Câmara dos Deputados se uniu novamente em torno de uma bandeira que pode levar a um retrocesso que anulará décadas de conquistas sociais em nosso país: a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania admitiu a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215/2000 e de outras dez anexas a ela.

Uma decisão contrária à Constituição, à Justiça, e à Cidadania — exatamente o que a Comissão deve proteger.

Em síntese, as emendas admitidas, se aprovadas pelo Congresso, farão com que nenhuma reserva indígena, quilombola ou zona de conservação ambiental venha a ser criada sem votação no Legislativo.

Considerando a força da bancada ruralista, isto significa, na prática, que não haverá novas reservas indígenas, áreas de conservação ambiental ou quilombolas. Os defensores destas propostas argumentam que, por ser o Legislativo mais plural e representativo do que o Executivo, ao se dar àquele esta atribuição, a proposta seria um avanço democrático. Falso.

Antes de mais nada, tais propostas são flagrantemente inconstitucionais.

Jamais poderiam ter sido consideradas admissíveis porque violam o artigo 60, parágrafo 4, da Constituição Federal, que estabelece que "não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir (III) a separação dos Poderes" e "(IV) os direitos e as garantias individuais". De uma só vez, as emendas propostas violam essas duas proibições constitucionais.

Primeiro, porque o ato de demarcação de terras indígenas é administrativo e cabe, exclusivamente, ao Executivo — conforme entendimento do STF no julgamento da ação popular em torno da Reserva Raposa Serra do Sol.

Assim, o Congresso tomar esse poder do Executivo representa usurpação, uma afronta à separação de Poderes republicanos. Segundo, porque os constituintes de 1988 consideraram as terras indígenas direitos originários destes povos e, portanto, anteriores à atual Constituição, que precisam ser reconhecidos e respeitados. Na medida em que as propostas de emendas constitucionais criam obstáculos ao reconhecimento e ao respeito a estes direitos, tendem a aboli-los e, portanto, violam, evidentemente, a Constituição (artigo 60, parágrafo 4,).

A aprovação da PEC 215/2000 foi mais uma demonstração de força da bancada ruralista na Câmara. É a sanha por mais terras para o agronegócio.

A nova fronteira, depois da mutilação do Código Florestal. Impedir que continuem sendo reconhecidas terras indígenas e quilombolas e criadas zonas de conservação ambiental parece ser fundamental para quem só pensa em derrubar árvores para ganhar mais dinheiro. Mesmo que isto represente uma ameaça aos ecossistemas de nosso país e violações aos direitos de indígenas e afrodescendentes.

Mesmo que isto signifique fazer a Câmara retroceder décadas.

Perdeu-se a primeira batalha, mas não a guerra. Vamos recorrer da decisão, lutar contra este atentado à Constituição e combater este absurdo. Se não for suficiente, rumo ao STF — para impedir esse absurdo retrocesso."

ALESSANDRO MOLON é deputado federal (PT-RJ).

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